segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Carl Sagan, motivo de inspiração



Carl Sagan

Na natureza, como ensinou Lavoisier lá no século XVIII, nada desaparece: tudo se transforma. Carl Edward Sagan, morto aos 62 anos, no dia 20 de dezembro de 1996, de mielodisplasia, em Seattle, nos Estados Unidos, transformou-se em conhecimento. O que ele sabia, e era muito, ensinou para milhões de semelhantes. Vivo, era uma estrela boa, de luz intensa. Morto, parece que continua assim. Vamos aqui nos permitir uma licença poética, ou melhor, científica. Vamos dizer que Sagan foi para o céu. Ele iria gostar disso.
O homem foi um popstar da divulgação científica. Seu livro Cosmos, lançado em 1980, se tornou o mais vendido de todos os tempos no campo da divulgação científica. E a série de televisão, com o mesmo nome, foi assistida por meio bilhão de pessoas em sessenta países. Nada mau para um planeta onde, segundo as pesquisas, a maior parte dos habitantes é ignorante em ciência. Talvez, justamente porque mestres como Sagan são muito raros.
Popular entre os leigos, esse nova-iorquino também ganhou respeito nos meios acadêmicos. Desde os anos 50 foi consultor da Nasa para as viagens à Lua, e para o projeto das naves Voyager, Pioneer e Galileu. Cientista brilhante, acumulou um vasto conhecimento sobre os planetas e ajudou a explicar diversos mistérios sobre eles. Como o terrível calor de Vênus, que chega a 470 graus Celsius, devido ao excesso de gás carbônico na atmosfera, ou a neblina púrpura do satélite de Saturno, Titã, causada pela presença de moléculas orgânicas. Sagan não vai ter a chance de ver os próximos passos da conquista do espaço. Ou, como ele mesmo escreveu no último capítulo de Cosmos, a “grande aventura que a humanidade está começando a empreender”. Mas é verdade que, depois dele, a humanidade também ficou um pouco mais perto do céu.

Um beijo viaja pela Galáxia

    Mais do que qualquer outro escritor de divulgação científica, Sagan fez sucesso devido ao entusiasmo com que defendia a idéia da racionalidade e do progresso. Seus temas preferidos eram os que apontavam para um futuro de grandes realizações, como as visitas possíveis aos planetas próximos, a descoberta de novos tipos de estrela ou mesmo de seres inteligentes em outros pontos da Galáxia. Mas Sagan acrescentava um algo mais ao dizer que as conquistas só aconteceriam se os homens se livrassem de seus comportamentos irracionais, coisas como as guerras, o apego às crendices, a destruição do planeta por desrespeito à ecologia.
Em outras palavras, aos olhos dos leitores o cientista aparecia como um profeta – e um profeta do melhor tipo, otimista e sempre disposto a discutir qualquer tema sem preconceito e sem arrogância. Nesse clima, teve grande importância o interesse do astrônomo pela possibilidade de encontrar alienígenas entre as estrelas. Sagan sempre fez o que pôde para entrar em contato com possíveis ETs. Nas naves Pioneer 10 e 11, lançadas em 1972 e 1973, respectivamente, colocou placas de metal contendo informações sobre este planeta e seus habitantes. Antes de mais nada, um desenho mostrava um casal de seres humanos nus. Ao lado, uma carta planetária dava a localização da Terra na Galáxia.
Em 1976, o experimento foi repetido nas Voyager I e II, que, em meio a uma parafernália de aparelhos científicos, transportavam discos de ouro contendo saudações em mais de sessenta línguas, além de sons de baleias e o estalar de um beijo. De quebra, colocou dezessete fotos digitalizadas e várias músicas. “Queríamos mandar uma canção dos Beatles, Here Comes the Sun, mas acho que os donos dos direitos autorais ficaram com medo de alguma pirataria extraterrestre”, ironizou Sagan. “O fato é que não permitiram.”
O cientista também foi uma figura central em várias tentativas de captar, via rádio, recados inteligentes vindos de outros recantos da Galáxia. Entre os projetos dessa categoria, o mais conhecido foi o SETI, sigla em inglês para a expressão “busca de inteligência extraterrestre”.
Apesar disso tudo, Sagan combatia a crença em discos-voadores. A chance de um ser inteligente visitar a Terra é zero, já que, se existem civilizações tecnológicas além da nossa, devem ser raríssimas. Afinal, diante das imensas distâncias cósmicas, seria o cúmulo da coincidência duas delas se encontrar. Em seu último livro, O Mundo Assombrado pelos Demônios, o astrônomo explica exaustivamente sua posição sobre esse ponto e ataca sem piedade todo tipo de crendices e bruxarias, do alegado poder dos cristais à existência de Atlântida. Definitivamente, a crença de Sagan era a ciência. Como ele ensinou: “Somente uma visão cética do mundo pode levar à ciência”.

Efeito estufa no estilo venusiano
    A pesada atmosfera do planeta Vênus deu a Sagan a oportunidade de realizar sua principal contribuição ao conhecimento científico moderno. O desafio era simples. Como Vênus é muito similar à Terra, não havia motivo lógico para a altíssima temperatura medida na sua superfície, que gira em torno de 470 graus Celsius, o suficiente para derreter chumbo. As análises feitas por Sagan e outros levaram à conclusão de que o calor absurdo vinha da imensa quantidade de gás carbônico existente no ar venusiano. Esse gás deixa a luz do Sol entrar e aquecer o solo, mas não a deixa voltar para o espaço em forma de calor. É o efeito estufa, o mesmo que, em escala muitíssimo menor, é acusado de elevar a temperatura da Terra.
O astrônomo também deu uma explicação convincente para as intrigantes mudanças de cor observadas periodicamente na superfície marciana. O motivo, apontado por Sagan, são tempestades de areia, tão grandes que parecem escurecer o solo avermelhado. Curiosamente, esse problema é semelhante às enigmáticas neblinas cor de cobre vistas em Titã, uma lua gigante de Saturno. Esse outro mistério Sagan resolveu na década de 80, analisando fotografias antigas da lua de Saturno. Concluiu que a neblina era feita de hidrocarbonetos, que são moléculas orgânicas do tipo das que se encontram no petróleo.
Há poucos meses, ele lamentou não ter informações novas sobre a lua saturnina. “Mal posso esperar que uma sonda espacial aterrisse lá e traga dados mais precisos de sua superfície.” Sagan morreu antes de realizar esse desejo. Mas os astrônomos se encarregaram de premiar sua dedicação ao conhecimento dos planetas dando a um asteróide o nome 2709 Sagan. Ou seja, não foi só como uma metáfora que, em uma das várias homenagens após morte, um de seus alunos escreveu: “O céu era seu lar. Ele está finalmente em casa”.

*Todos os créditos de autoria para revista super interessante

Por: Douglas

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