Algumas
associações entre as festividades do Natal e do São João com as Estações do Ano
Cada estação do ano é
um fenômeno físico (astronômico) e também um fenômeno cultural de vários povos,
que é possível se conhecer através de pesquisas sobre o folclore, os mitos e as
religiões de cada um deles e explicita as relações entre o Homem/sociedade e a
natureza/ambiente.
O Solstício de Verão é
comemorado pelos povos nórdicos por causa dos longos invernos. Não há festas
populares espontâneas para a comemoração do Solstício de Verão nos países
tropicais, porém o Natal e o São João são festejados na América por influência
cultural européia. Tal fato ocorre provavelmente porque a maior parte do
planeta só tem marcadamente duas estações do ano, o Verão e o Inverno, é o que
advém nos trópicos e nas zonas polares.
As zonas temperadas do
Norte e do Sul, possuem as quatro estações do ano bem diferenciadas e
definidas. Daí haver quase um “determinismo geográfico” para a existência das
festividades do Natal e do São João.
Nas altas latitudes da
Europa, mais especificamente nos países nórdicos, e dentre eles a Finlândia, o
assunto das estações do ano é muito especial. Segundo um documentário
apresentado em DISCOVERY CHANNEL (1995), para os povos nórdicos que vivem na
fronteira entre a zona temperada do Norte e a zona polar Ártica, o dia 21 de
junho que marca aproximadamente o Solstício de Verão para o Hemisfério Norte, é
um dia de festa extremamente importante, pois é “um dia de luz no qual se
comemora coisas novas quando as velhas chegam ao fim”. Nesse dia deve-se “gozar
a luz, mesmo sabendo que as trevas estão chegando”. Nos países nórdicos
europeus, que são atravessados pelo Círculo Polar Ártico ocorre o Sol da
meia-noite, no Solstício de Verão e seis meses depois a completa escuridão, por
vários dias, por ocasião do Solstício de Inverno em 22 de dezembro.
Na Finlândia, no final
de semana mais próximo ao Solstício de Verão, é comemorado o nascimento de São
João Batista, que tradicionalmente ocorre no dia 24 de junho. Os finlandeses
brindam ao Sol da meia-noite com vodka, desejando algo para o futuro. Eles
acrescentaram a essa informação, vários rituais pré-cristãos de adivinhação do
futuro, enquanto o cardápio das refeições festivas envolve alimentos típicos
desta estação do ano. As frutas de verão , por sua vez, fazem parte dos bolos e
das tortas.
Curiosamente em alguns
países o Solstício de Verão é chamado de San Juan(Espanha), San
Jacques (França) e San Johannes na Finlândia. Por outro lado,
segundo LINHARES (1985), o dia 25 de dezembro – o Natal – é simbólico, pois
esta data foi fixada pelo Papa Júlio I, no século IV, para se festejar o
nascimento do “Filho de Deus feito Homem”, em substituição a festa romana pagã
do Solstício, consagrada ao Sol. O dia de São João também foi fixado pela
Igreja Católica para lembrar a relação estreita entre João e Jesus Cristo, pois
João nasceu no Verão do Hemisfério Norte, exatamente seis meses antes de
Cristo. Como João era um “iluminado”, um profeta, e como o Solstício de Verão é
o dia mais longo do ano, no Hemisfério Norte, foi natural a associação entre um
fenômeno astronômico e a religião, o que culminou na instituição dessa data
comemorativa.
A Igreja Católica
postula que João afirmou que Jesus tornar-se-ia cada vez mais luminoso, por
isso a Jesus é atribuído o nascimento no Solstício de Inverno, que tem a parte
clara do dia mais curta do ano e a parte escura ou noite mais longa do ano, no
Hemisfério Norte. O que ocorreria a Jesus, segundo João, é exatamente o que
ocorre ao Sol. Após 24 de junho (nascimento de João) o Sol fica cada vez mais
baixo no céu, de maneira que os dias ficam mais curtos. Após 25 de dezembro
(nascimento de Jesus) o Sol fica cada vez mais alto no céu, desta forma a parte
clara dos dias ficam cada vez mais longos e as noites mais curtas,
paulatinamente.
De acordo com DISCOVERY
CHANNEL (1995), os dias mais escuros de dezembro são considerados como dias de
renascimento para os povos nórdicos, que anseiam pelos dias mais luminosos do
Verão em junho. Deve-se notar que essas datas festivas de Natal e de São João
são “próximas” dos Solstícios, mas não coincidem com eles.
Acredita-se que João
batizou Cristo, por isso a água é uma parte importante nesta comemoração entre
os povos católicos. A água simboliza a purificação e o batismo. O fogo é o
símbolo do Sol. Os finlandeses fazem fogueiras para incentivar o Sol a manter
seu bom trabalho, o que se constitui em um dos mais antigos rituais
remanescentes da Europa. A fogueira é um ritual oferecido ao Sol, no qual os
nórdicos pedem luz e calor eternos, representando a esperança coletiva de um
futuro brilhante.
Essas fogueiras
eram feitas também na Inglaterra, há alguns séculos, porém eram constituídas de
ossos preenchidos por poções mágicas, que ao queimar afastariam os espíritos
malignos, que tinham o poder de fazer o Sol se enfraquecer.
Na Mesopotâmia, por sua
vez, há uma lenda associada ao nascimento de crianças de linhagem sagrada babilônias.
Essas crianças eram quase sempre concebidas em rituais de casamentos na
primeira Lua Nova do ano, após o Equinócio de Primavera. Dessa forma as
crianças nasciam no Solstício de Inverno, ou Nata, e se tornavam altos
sacerdotes, poetas e reis e rainhas.
Considera-se que até
mesmo Jesus – o Menino Divino do Natal cristão – nesta concepção foi
supostamente uma criança concebida na primeira Lua Nova da Primavera, sendo
metade divina e metade humana, tal quais as crianças sagradas da Babilônia e os
heróis Gilgamesh da Suméria e Hércules da Grécia. Este é outro exemplo de como
as religiões apropriaram-se de eventos astronômicos para seus símbolos, dentre
eles as estações do ano.
No Brasil e em toda a
América Latina, também há comemorações populares dos dias de São João e do
Natal, que são heranças da cultura ibérica católica. Segundo ARAÚJO (19--), São
João Batista, é o santo mais festejado em todo o Brasil. No interior baiano é
um dia santificado e a partir do meio-dia do dia 23 iniciam-se as comemorações.
São feitas fogueiras nas fazendas, sítios, bairros rurais e nas áreas urbanas.
Os mercados, as feiras e as casas comerciais ficam cheios de pessoas para
comprar os preparativos para a ceia deste dia, destacando-se a canjica, o bolo
de São João ou "bolo de carimã com ovos", amendoim cozido e carne.
Nesta festa há flores por toda parte que surgem após as chuvas de inverno que
precedem o dia de São João no Agreste brasileiro. Também se tira a sorte por
meio de jogos cuja finalidade é saber o futuro, em geral quanto à nupcialidade.
Note as semelhanças de mitos e rituais entre as comemorações nórdicas
européias, brasileiras e portuguesas, esta última, vem a seguir:
TOCANTINS (1963) afirma
que no séc. XVIII, em Portugal chegou-se a utilizar um calendário com base
no dia vinte e quatro de junho. Neste calendário o ano era contado de São João
a São João. O banho-de-cheiro dos paraenses teve origem no costume português do
banho de rio obrigatório no dia de São João, que no século XIV era comum na
Europa Ocidental. A sorte, a alegria, a prosperidade, a saúde e o dinheiro,
dominam o pensamento de todos na festa de São João, que simboliza o Solstício
de Verão para o Hemisfério Norte e a anunciação de Jesus, após seis meses no
outro Solstício.
Os estudos em Geografia deveriam
abordar este assunto com mais freqüência, proporcionando uma imersão em
culturas de outros países, através de lendas, superstições, festas, cardápios
de comidas e bebidas feitas de frutas e vegetais típicos de cada estação do
ano.
Vamos celebrar o Natal
e o São João as festas irmãs mais populares do cristianismo!
Créditos de Autoria: Prof.
Dr. Paulo Henrique Azevedo Sobreira | Instituto de Estudos Socioambientais | Planetário
da UFG
Adaptado
de:
SOBREIRA, Paulo
Henrique Azevedo. Astronomia no Ensino de Geografia – análise crítica nos
livros didáticos de Geografia. Dissertação de mestrado apresentada a FFLCHUSP,
São Paulo, 2002a. 275p.
Referências
Bibliográficas
ARAÚJO, Alceu Maynard. Folclore
nacional. São Paulo: Edições Melhoramentos. 3 v. 19--
DISCOVERY CHANNEL O
sabor de viajar – Finlândia.Travel Channel/Discovery Channel, 1995.
LINHARES, Thelma R. S.
Natal. Fundação Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais; Centro de Estudos
Folclóricos. Folclore. Recife, 117, dez. 1981
TOCANTINS, Leandro. Santa
Maria do Belém do Grão Pará. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira,
1963